Na música: protagonista ou coadjuvante?

Assumindo o protagonismo e entendendo a importância de valorizar o protagonismo do outro

 
“Você devia fazer texto sobre essa foto!”, disse Fred Pacheco, meu parceiro de banda DOM. Mas, o que a foto poderia me dizer e que pudesse encontrar eco no coração de quem iria ler?
 
Essa foto foi tirada no festival da casa Shalom, no Rio de Janeiro, por volta de 1999. O Fred se inscreveu e me perguntou se eu tocaria com ele. Perdi a conta das vezes que isso aconteceu, cantores e compositores me pedindo para acompanhá-los. A verdade é que: cantores e instrumentistas têm dinâmicas diferentes na música. 
Cantores estão, geralmente, na beira do palco, microfone aberto, voz amplificada, protagonismo declarado. Em contrapartida, os instrumentistas ocupam o fundo, com os olhos no instrumento ou na partitura: coadjuvantes. Na vida, também, vivemos essas dimensões.
 
Ninguém sustenta o tempo todo o peso do protagonismo sem pagar um preço muito alto. Ninguém sobrevive sem o reconhecimento que lance luz sobre o esforço feito para que alguém brilhe. 
Eu nunca lidei muito bem com o protagonismo e com tudo o que vem com ele. Sempre preferi os bastidores, o ensaio, o estúdio. Mas, não assumir a condução do processo, pode nos deixar sermos arrastados pelo outro, nas dificuldades, limitações e neuroses dele.

Respeitando as diferenças e valorizando as semelhanças 

Aprendi muito na banda DOM vendo o Filipe Freire atuar como produtor: sempre tentando extrair do outro o seu melhor, às vezes, chamando para si a responsabilidade de “apenas” decidir. 
 
Aprendi com o Fred sobre sentar-se, sem destaque, lado a lado com os músicos. Aprendi a entender que a composição não ganha vida sozinha. Aprendi muito com a banda Dom e continuo aprendendo.
E, hoje, aos 48 anos encontrei outro parceiro. Nosso projeto tem o equilíbrio da maturidade de quem já viveu bastante e sabe que somos todos diferentes e nessa diferença encontramos nosso espaço único. Eu e o Rodrigo Grecco (instrumentista e cantor) não fazemos um projeto solo, pois temos um duo. Dividimos as composições, o estúdio e o palco: DOISRIOS. Respeitando as diferenças e valorizando as semelhanças.
 
Outro dia, conversávamos sobre nossas composições e já não sabíamos a quem de nós cada uma delas pertencia. Não sabíamos qual verso ou melodia cada um tinha composto e ficamos felizes por essa trajetória. A foto é significativa e ficou como a lembrança de um processo que continua; de uma estrada percorrida. 
 
Viajar é bom quando sabemos que cada parte do caminho tem suas riquezas e tristezas. Porém, continuar é o mais importante e sempre assumindo o protagonismo e entendendo a importância de valorizar o protagonismo do outro.
Muitos evangelizadores dão exemplo desse equilibro: desde João Batista, Santo Agostinho, São Francisco de Assis até o legado de Bento XVI. Esses citados e tantos outros, “abriram mão” do protagonismo em função do outro. 
Eu sigo rezando, tentando, errando e aprendendo, mas feliz com as escolhas. 
 
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