FORMAÇÃO PARA MÚSICOS

Não existe arte sem dor

No processo da dor e do sofrimento você encontra a criatividade

Artista bom é artista sofrido. É interessante percebermos que há uma conexão tão direta entre o processo criativo com aquilo que o artista sofre.

Arthur Schopenhauer, um dos filósofos mais ateus que a história já teve, intuiu de maneira belíssima que “o sofrimento é a fonte da criatividade”. Mas também intuímos, pela própria vida, que o sofrimento, quando não administrado do jeito certo, acaba sendo uma fonte de destruição para nós.

Não existe arte sem dor
Se você tem aquela sensação de que perdeu algo e que o sofrimento é somente um momento de perda, nunca descobrirá arte no que está perdendo, pois arte é um jeito diferente de olhar para tudo. Artista não é só aquele que compõe uma música, que escreve um texto ou faz uma obra de arte. A arte é muito mais um jeito de enxergar o mundo do que necessariamente uma obra que se faz. Mesmo porque, você encontra artistas que nunca fizeram uma obra de arte. Aí você descobre como é interessante que, no processo da dor e do sofrimento, você encontra a criatividade. Às vezes, somos colocados em alguns limites e passamos a mostrar o que temos de pior.

Deus nos dá a oportunidade de escrevermos o que precisamos aprender. Às vezes, você está com aquela pretensão de ensinar as coisas a alguém, quando, na verdade, quem precisava saber daquilo tudo é você.

Muitas vezes, temos razão para jogar tudo fora e perder a paz. Não façamos isso! Comecemos de novo.

Se a gente começa a enxergar a perda como definitiva, como algo que não se recupera mais, o sofrimento se torna infértil e nunca vamos conseguir fazer arte deste sofrimento. Pelo contrário, fazemos desastre.

Precisamos interpretar com a sabedoria do Evangelho o momento que vivemos. Nós acreditamos no Evangelho para nos mover neste momento, para nos colocar de pé no momento em que não temos forças. O Evangelho não pode ser uma força teórica a mover a nossa inteligência, mas a nossa inteligência tem de mover a nossa prática. Temos de descobrir uma conexão entre aquilo que acreditamos de Jesus, com aquilo que vivemos em suas pequenas derrotas. Aí, então, você fará arte.

O sofrimento, a decepção e a derrota são matérias-primas de nossa arte, de nossa reinterpretação da vida. A arte nos atinge no momento em que tudo dá errado e nós precisamos reconstruir. Precisamos pegar a peça e trabalhá-la de novo. 

A arte nasce dentro do artista, na capacidade de ultrapassar as pontes, de buscar o que está do outro lado.

O artista, quando interpreta a sua missão de fato, ele é naturalmente cristão, porque o Cristianismo é isso, é a arte de constantes recomeços. Nunca estamos prontos, nunca chegamos ao lugar definitivo. É sempre experiência de passagem.

O Cristianismo é a arte de constantes recomeços

Quando alguma coisa nos contraria, esbarramos nesta experiência do limite. Ou nos tornamos amigo do limite e o encaramos de forma positiva, ou vamos acabar tornando-o ainda maior, que é o limite de não continuar. Não é o limite que administra você, é você quem o administra. O artista não para na obra, ela nunca é definitiva, ela nunca está pronta.

transformar a dor em arte - ziza
A nossa verdade costuma morar nos rascunhos, a nossa verdade costuma morar naquilo que não queremos mostrar, naquelas coisas que não estão tão fortalecidas para tocar, para tornar evidente. Por isso o bom artista é aquele que consegue colocar na obra uma infinidade de possibilidades de rascunho que estão sustentando a obra.

Temos de ser muito artistas para mostrarmos a dor sem desespero. Temos de ser muito artistas para extrairmos arte no momento da dor. Às vezes, não conseguimos. Cada vez mais escondemos o que somos, cada vez mais queremos criar personagens. Nós somos sensíveis e precisamos admitir isso, porque se negarmos o sofrimento que nos ataca, ele nunca vai virar arte dentro de nós.

Façamos arte a partir do sofrimento, essa é a mensagem. Quando descobrimos uma coisa que nos faz sofrer e percebemos que ela não precisa fazer sofrer tanto assim, isso se torna arte. É um jeito de vermos o avesso, de vermos sempre um lado bom dos acontecimentos.

 

 

Pe. FábioPadre Fábio de Melo

Sacerdote católico, cantor, compositor, poeta, escritor, professor e apresentador.

 

 

Transcrição e adaptação Renata Santiago

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